
«Perguntar a um escritor o que ele pensa dos críticos é o mesmo
que perguntar a um candeeiro o que ele pensa dos cães.»
Cristopher Hampton
«Morrer é pouco, é fácil; mas ter vida delirando de amor,
sem fruto ardendo, é padecer mil mortes, mil infernos.»
Bocage
«Saiba morrer o que viver não soube.»
Bocage
«Ah! Se a vossa liberdade
Zelosamente guardais,
Como sois usurpadores
Da liberdade dos mais?»
Bocage
Caros autores; obrigado por serem quem são e por estarem mais uma vez connosco
nesta nova “aventura literária” das Edições Colibri (4º livro desta diferenciada
e peculiar “coleção de tributo e de celebração de grandes escritores de
Língua Portuguesa” que, por serem clássicos, pedagógicos, grandiosos,
geniais, significativos e impactantes, são também escritores do mundo,
intemporais, eternos). Estamos rendidos ao vosso talento e criatividade mais
uma vez demonstrados nesta obra e oxalá possamos pelo tempo fora — entusiasmados
quanto baste e em conjunto — desenvolver projetos literários que possam continuar
a ser (como um certo “crítico literário” afirmou), justamente, considerados como
uma espécie de “serviço público” ou semelhante. Assim sendo, três belos,
interligados e indissociáveis ideais nos movem e galvanizam (fundamentando e
dando, desejavelmente, mais sentido e
significado às nossas vidas): Amor, Humanismo e Arte.
Caros leitores e autores/escritores; por norma, neste tipo de
textos de introdução a obras literárias, para contextualização, “orientação de
leitura” e/ou enquadramento de uma obra diferenciada — como neste caso —, temos
por hábito produzir aquilo a que designamos de “Avulsas Impressões”,
onde opinamos e especulamos de forma livre e peculiar, algo informal e
coloquial, mas autêntica e sempre que possível ousada, em busca de…, com o
intuito — nunca gratuito, mas assumido, consciente e em dialética com o leitor — no sentido de
subverter e de “agitar as águas”, pois o “exercício da crítica” tem o nobre
propósito de compreender, de encontrar outras e diversas orientações de
investigação e de hermenêutica a fim de não ficarmos “agarrados” ao demasiado ortodoxo
(ao tido e aceite como oficial e “sagrado”, bem como intocável para alguns…) e
de ir, desejavelmente, em busca do heterodoxo, do diferente e do inovador
(qualquer coisa como “pensar fora da caixa”… pensamento divergente…, pois
andamos por cá também em busca de outros Sentidos inspirados e
orientados a partir dos clássicos). Em síntese, há que ter a coragem e a
ousadia de sairmos das nossas zonas de conforto e partir para a aventura
abraçando o Desconhecido. Não apreciamos “Tratados literários” sobre o que quer
que seja, e, mais uma vez, também esta obra e estes maravilhosos autores nos
dizem e nos demonstram que há outros “olhares”, outras formas de rececionar, de
entender e de fruir o extraordinário legado do poeta maior a que estamos a
prestar merecido tributo. Uma vez que o poeta que a todos nos inspira,
sensibiliza e motiva, é nada mais nada menos do que o grandioso, sublime e
singular Bocage, concluímos que a nossa (e
também de alguns outros – infelizmente poucos…) hermenêutica e
interpretação do seu extraordinário legado literário se consubstancia numa espécie
de simbiose/mix — digamos assim —
de ortodoxia e de desejável heterodoxia que pode resultar num
entendimento/compreensão do seu legado nem sempre consensual suscitando
opiniões diferenciadas, originais, inovadoras, contraditórias (e ainda bem)…
Sem qualquer pretensiosismo literário — pois
nem sabemos o que isso é! —, um dos nossos propósitos — entre outros — é também
contribuir para a causa nobre de descoberta e de compreensão do poeta bem como,
se possível, “atualizar” a investigação e o conhecimento sobre Bocage a fim de
se poder originar outros e diferenciados debates bem como outras, diferentes e
ousadas interpretações. É sabido que Bocage foi o poeta das tertúlias (e da Dialética
espontânea) por excelência, e oxalá que esta “obra de tributo e de culto” nos
possa motivar e galvanizar para essa tão importante dimensão das nossas vidas: a
Dialética (método de análise filosófica/literária e de argumentação que
envolve a contraposição e o confronto de ideias opostas — tese e antítese a fim
da síntese que voltará a ser tese e antítese — à maneira dos grandes filósofos
gregos da antiguidade clássica). Em certos casos (o que de facto aconteceu com
outros escritores em apologia/celebração/tributo nas obras anteriores desta
coleção) tomámos — queremos nós acreditar que assim foi — a decisão de
encontrar o que de mais disruptivo, diferenciado, revolucionário, original, inovador
e ousado possa existir nas suas poderosas e sublimes obras (nos seus legados
que urge conhecer) e apresentar argumentos, análises, bem como intuições/perceções
nossas que possam — até onde nos for possível — “pôr em causa” (nem que seja
apenas e só para “agitar as águas”, inquietar, perturbar) a ortodoxia pura e
dura, a hermenêutica mais consensual, bem como a “exegese” tida — para alguns —
como “sagrada”; sendo que para outros, o poeta continua a ser praticamente intocável
e impenetrável quanto a novas interpretações. É bom de ver que o nosso
propósito/orientação é outro e assumidamente arriscado, pois novas leituras e
interpretações, à luz do nosso tempo e das nossas mundividências, tornam
desejavelmente estas obras (os “nossos clássicos” — os desta diferenciada coleção
em particular) absolutamente cruciais para a compreensão da “condição humana”
que é, como sabemos, o grande foco da Literatura e das artes em geral. A famosa
recomendação do “conhece-te a ti mesmo” socrática (inspirada no famoso Óraculo
de Delfos – Grécia), só é possível, autêntica e honesta, a partir do
conhecimento dos clássicos. Já muito se investigou, escreveu e partilhou, do também
vate Manuel Maria Barbosa du Bocage, e, do que foi por nós percecionado, constatado/entendido
após alguma ligeira revisitação do seu legado — particularmente a leitura e
fruição dos seus sonetos mais belos e significativos — (tanto em académicos e
investigadores portugueses tidos de elevada reputação/credibilidade bem como em
outros considerados apenas curiosos e apaixonados, mas interessantes e que
devem ser conhecidos também…) é que o nosso poeta de Setúbal (e do Uni-Verso),
na sua curta vida de apenas 40 anos (1765-1805) apresenta uma atribulada e
intensa demanda existencial e um percurso literário (boémio, vagabundo, errante,
estético, contestatário, revolucionário, progressista, inconformado, transgressor,
provocador e também “putanheiro”) original a partir de um certo momento (pois,
no início, mais parecia uma grandiosa e muito bem conseguida imitação do seu
Mestre/Ídolo e admirado Camões), diferenciado, disruptivo, ousado, corajoso e
visionário. É claro que o nosso poeta amava e deixava-se inspirar pelos grandes
clássicos, e, para além de muito se sensibilizar com Camões, conhecia também (pois,
apesar de errante e boémio, Bocage era um homem bastante culto e curioso), e
deixava-se inspirar por “outros mestres” como Virgílio (Eneida), Ovídeo
(Metamorfoses), pelos pensadores gregos, pelos escritores greco-romanos,
entre outros, que — a bem da verdade — nunca deixaram de ser a nossa matriz
cultural, filosófica e literária até aos dias de hoje. Olhamos com os “olhos de
hoje” para o singular legado de Bocage e deparamo-nos com um poeta inquieto,
irrequieto, insatisfeito e sempre excessivamente apaixonado, aqui e ali “místico”
tal como nós (bem sei que alguns “especialistas” de Bocage não irão apreciar
esta tirada, mas…). Como diria o seu mestre
e admirado Camões (e partindo do princípio que estão ambos acompanhados dos
grandes criativos e génios de todos os tempos, em tertúlia constante em outra
dimensão do Uni-Verso), Bocage — definitivamente — da
“Lei da Morte se libertou”. Façamos por agora um pequeno exercício mental — que
até poderá (quem sabe?) vir a ser uma possibilidade real numa próxima
reencarnação —: imaginem os dois a competir no mesmo tempo e no mesmo espaço “físicos”
com alguns de nós (pois assim esperamos que aconteça lá muito para a frente
mesmo). Ao longo de vários anos, a interpretação/compreensão e pertinência literária
e estética deste peculiar poeta, tem sido mais ou menos consensual (para nós,
demasiado consensual até), e, também por isso, e por agora, alinharemos na
desejável meta-compreensão proporcionada pelos enquadramentos, contextos, situações,
influências e determinações estilísticas que o nosso poeta sofreu na sua curta,
mas intensa e singular vida, e que os trinta e dois autores desta “obra de culto” nos vão
apresentando e partilhando. Assim, e também por isso, que nos possamos deixar
tocar e sensibilizar por estes “textos” de celebração, de crítica, e sobretudo
de reconhecimento e de agradecimento, a este grande poeta que tanto tem
impactado a nossa cultura. Bocage foi e continua a ser — de forma exagerada e
demasiado redutora — conhecido como o poeta boémio e errante, o tal das
anedotas/piadas picantes e eróticas (esta sua faceta tão interiorizada e
conhecida pelo povo em geral); o poeta do satírico, do burlesco, o “mulherengo”
(que muitos e diversos favores fez às mulheres dos outros, às esposas e filhas
dos seus amigos e conhecidos), que tantas vezes diviniza a Mulher (vários e
sublimes sonetos são prova disso mesmo) e que também canta a sua sensualidade e
inteligência de forma tão elegante e inigualável, que inclui o erotismo e até a pornografia (mas também nesta
última, mantém uma certa elegância e usa uma linguagem/conceitos que convertem a “Pornografia” numa espécie de
subgénero literário que de alguma forma Bocage valorizou e ajudou a credibilizar
até hoje. E sobre este aspeto em particular, leia-se o magnífico ensaio da
também ensaísta e investigadora Maria de Fátima Rocheta Bastos, incluído nesta
obra, onde este tema está muito bem apresentado e, a nosso ver, esclarecido).
Bocage é coerente, frontal, verdadeiro e autêntico como nenhum outro poeta que
se conheça, tanto do seu tempo, antes dele e depois dele, até aos dias de hoje.
A sua hilariante vida terrena, “surreal”, trágica quanto baste, cheia de confusões,
peripécias e de aventuras, com várias viagens involuntárias/forçadas pelas
vicissitudes do seu quotidiano “desregrado” (apenas aos olhos de vários dos
seus contemporâneos) e do destino (Fado / Moira — «Na
mitologia grega, as Moiras eram três irmãs-deusas que determinavam o destino
tanto dos deuses quanto dos seres humanos. Eram três mulheres lúgubres,
responsáveis por fabricar, tecer e cortar aquilo que seria o fio da vida de
todos os indivíduos» Fonte: Wikipédia.), compromissos e obrigações
alheias à sua sempre exacerbada vontade, perseguições, incompreensões, sempre
avesso às normas/regras/leis (tendo a coragem de as não cumprir em muitas
situações, de as problematizar, contestar, negar…), imposições e orientações
que lhe apresentaram para seguir, resultaram num ser combativo, transgressor,
provocador, subversivo, irreverente, inconformado, progressista, cheio de
conflitos físicos, sociais, culturais, filosóficos, religiosos/teológicos (pois
se nos apresenta como o anticlerical por excelência o que era muito arriscado e
problemático para a época…), políticos, axiológicos, “almíficos”...
Bocage foi um homem fora do paradigma da sua época terrena, muito à frente do
seu tempo (e também por isso considerado por vários como perigoso e herético), foi
um “rebelde visionário”, que agora nos parece desencaixado daquela conjuntura
que ele muito conjeturou, e que pode ser legitimamente por nós (hoje)
considerado um ser de “outro mundo”, inovador em quase tudo, curioso e original,
singular, altamente criativo, uma
espécie de “filósofo/pensador poético” um pouco à maneira do que veio a ser também
Antero de Quental muitos anos depois de Bocage e de certa forma — em vários
aspetos — também pelo nosso poeta inspirado (e não deixem de ler “escrever
ANTERO de QUENTAL”, 30 autores, Edições Colibri, 2024) e de
Descartes uns anos antes dele (Filósofo Francês do séc. XVII) que praticamente
tudo quis destruir para começar de novo e com novas bases e critérios…, que
desbravou, desocultou e desconstruiu — para compreender e evoluir — como
ninguém essa coisa da “condição humana”, e que lutou toda a sua vida — consigo
mesmo, com os outros e com as instituições — em busca de algo maior do que a
própria Vida: o Amor, a Liberdade, a Justiça, a Tolerância, o Propósito e o
Sentido. No fundo, podemos dizer e sintetizar que Bocage tentou “destruir” a
ordem instituída para que fosse possível iniciar-se uma nova e diferenciada ordem.
(E aqui temos o anticlerical, o simpatizante dos ideais republicanos e liberais,
aquele que receciona e abraça como nenhum outro da sua época, em Portugal, essa
“nova Luz” do seu tempo que a muitos ofuscou — entre outros, a Monarquia e o
Clero —, essa “coisa diferente”, ousada e fascinante que ficou conhecida como
“Iluminismo” e que iluminou o nosso poeta, tendo nós, felizmente, a possibilidade de sermos irradiados hoje em dia pela a Luz que
continua a emanar dos seus belos e diferenciados sonetos). Foi Bocage o
inquieto, o denunciante de hipocrisias, o irrequieto e o insatisfeito por
excelência; o poeta que conseguiu ser o “amigo mais íntimo” da Morte e da
Escuridão, e que, corajosamente brincou e “gozou” (mais uma vez para
compreender e subir/evoluir) com o lado mais negro da natureza humana. Tendo em
conta tudo isto, que não é pouco (que nos deve inquietar e perturbar),
preferimos, de seguida, destacar o que, à semelhança de investigadores,
críticos literários, académicos, curiosos e apaixonados como nós, nos parece
ser um percurso literário/poético absolutamente ímpar e extraordinário em Língua
portuguesa. Obrigado Bocage por seres quem foste – por seres quem és! Andas por
aí, pois és eterno. Continuas a
inspirar-nos e a sensibilizar-nos como nunca e os teus maravilhosos sonetos são
o sal e a pimenta (e, por vezes, também o açúcar, o doce — como para ti o foram
a Marília e as outras musas —) das nossas vidas. Se tivéssemos vivido na tua
época/século, com toda a certeza, teu amigo seríamos, bem como — eventualmente
— companheiros de luta, de causas (umas nobres e outras nem tanto) e, muito
provavelmente, de boémia. Estamos certos que estarás na Eternidade a protagonizar
e a animar grandes tertúlias para os deuses que te elegeram para esse grandioso
propósito (pois os deuses precisam de quem os anime e de quem os entretenha
pela Eternidade fora). Continua com essa nobre tarefa e tenta divertir-te (o
que muito desejaste, mas que nem sempre conseguiste nesta tua encarnação do
século XVIII). Por favor, espera — durante muito tempo (não tenhas mesmo pressa
nenhuma!) — por nós.
E, sem mais delongas — dispensando da nossa parte (e também de outros) qualquer análise ou comentário, pois o soneto é grandioso e diz o que é necessário e essencial saber —, aqui vos apresentamos, por ele mesmo, num dia em que se encontrava mais pachorrento, mas muito inspirado, o famoso soneto “autorretrato”, (publicado pela primeira vez em “Rimas” - 1971 - o único livro que o nosso poeta conseguiu ver publicado ainda em vida) físico e psicológico:
Magro,
de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno:
Incapaz de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos por taça escura
De zelos infernais letal veneno:
Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades:
Eis Bocage, em quem luz algum talento;
Saíram dele mesmo estas verdades
Num dia em que se achou mais pachorrento.
Aos 14 anos já é militar
(bem contrariado com este papel/função/”emprego”) e vai defender Portugal em
Goa e em Macau (de alguma forma, neste particular da sua vida, apresenta,
curiosamente, um percurso de vida semelhante ao seu ídolo/mestre Camões) e é também
por esta altura que inicia a sua caminhada “errante”, transgressora, “desbragada”,
“putanheira” e boémia. Estará uma temporada no Rio de Janeiro (Brasil) — mais
abaixo voltaremos a esta etapa da sua vida — e regressa para intensificar em
Lisboa uma “vida mundana” e ainda mais boémia sendo este “tipo de vida” que muito
alimenta a sua genialidade e talento produzindo sonetos inigualáveis,
autênticos e de extraordinária beleza. Escreve e divulga nos principais botequins da sua amada Lisboa o famoso poema “Pavorosa
ilusão da eternidade” (“Rimas”, 1791). É perseguido pelo Intendente Pina
Manique (a representação do Estado), depois processado pela Santa Inquisição, e,
por fim, exilado. Aquando do seu regresso, é acolhido no Convento de S. Bento
em Lisboa (curiosamente, o mesmo local onde funciona nos nossos dias a
Assembleia da República) e aí produz os seus sonetos considerados mais
significativos (“Rimas” - 1791, com 375 sonetos, 69 sátiras e 306 temas sobre
Amor, Liberdade, Filosofia; no fundo, uma obra ímpar sobre a condição/natureza
humana). É de facto — e sobretudo para a época — uma produção
considerável e também a maior quantidade de sonetos jamais escritos em tão
pouco tempo por Bocage.
Vamos agora olhar um pouco para o designado “período da Arcádia” (ou Neoclassicismo bocagiano se preferirem) e compreender o fascínio — que nunca o abandonou até ao “fim” — pelos clássicos de matriz greco-romana e pela forma e método clássico por excelência. Os árcades — tal como ficaram conhecidos por pertencerem à Arcádia — eram poetas muito refinados, “algo empertigados”, “algo pretensiosos” e também “algo convencidos”. Tudo aquilo era muito convencional, postiço, sem verdade, sem loucura, sem boémia, sem ousadia, sem pujança, sem autenticidade (bem ao contrário da genialidade de Bocage que sempre se sentiu deslocado nessa agremiação). Eram puros imitadores das fórmulas clássicas sem originalidade, sem arriscarem, sem paixão. Pois, claro está… que Bocage não se encaixou neste grupo, escola, paradigma… De início, o nosso poeta — mais por razões políticas, sociais e até por se encontrar em busca de alguma estabilidade e desejo de integração (que praticamente nunca obteve não sua curta vida) — começou por aderir ao grupo da Arcádia e aos ideais neoclássicos e também por imitar o grandioso Camões que sempre admirou (e que também muito citou nas tertúlias), e que particularmente ele, bem como todos os árcades, consideravam o maior dos poetas nacionais de sempre. Repare-se neste soneto altamente inspirado no “Mestre de Bocage” e com quem este se compara:
Camões,
grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
Arrostar co sacrílego gigante.
Como tu, junto ao Ganges sussurrante
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante.
Ludíbrio, como tu, da sorte dura,
Meu fim demando ao céo, pela certeza
De que só terei paz na sepultura.
Modelo meu tu és, mas... oh tristeza!...
Se te imito nos transes da ventura,
Não te imito nos dons da natureza.
Como acima já se aludiu, na sua juventude, Bocage entrou nos domínios da designada “Arcádia Lusitana”, sob o pseudónimo de Elmano Sadino. Aí, por contraposição ao ”paradigma” vigente, confrontou-se com alguns desafios que estimularam a sua criatividade e vontade de mais, pois o génio já lá estava: o rigor da forma, os mitos antigos, a elegância da medida e da métrica que são a “marca” do também genial poeta (e esteta, bem como “pensador”). Inspirado pelos ideais neoclássicos — Equilíbrio, Bucolismo, Razão, Beleza, Justiça… — o poeta buscava a harmonia com a Natureza e com o cânone/paradigma instituído. A poesia foi e continuou a ser uma “espécie de templo” (os grandiosos autores, de praticamente todos os géneros literários da Antiguidade Clássica, funcionaram na inspiração de Bocage tal como as suas musas de carne e osso…). Assim, Bocage e a Arcádia — para o bem e para o mal — são termos intrinsecamente ligados à história da Literatura Portuguesa. Apesar de quase sempre contrariado neste grupo de “convencidos e pretensiosos” (quase todos “intelectuais” da Igreja/Clero e da Aristocracia/Nobreza), Bocage acabou por se tornar um dos maiores poetas do Arcadismo em Portugal, participando ativamente nos eventos (tertúlias e encontros) literários desta “agremiação”, às vezes apoiada pelo Estado e sempre pela Nobreza. (Nem que fosse apenas pelo lanche/petisco oferecido e para ver as “gajas”, pois era mais por isso que Bocage lá ia…). Para quem possa estar menos familiarizado com o conceito que deu origem a este grupo poético, podemos dizer que o Arcadismo (Arcádia) foi um movimento literário inspirado na região montanhosa grega da Arcádia (situada no centro-sul da região do Peloponeso — Grécia —, sendo a sua capital Tripoli) que, acima de qualquer outra coisa, valorizava a simplicidade, a Natureza e a vida bucólica e idílica, e Bocage, apesar de — já por esta altura — ser também um poeta com muito interesse, ativismo e partilha dos “géneros” satírico e erótico/sensual, foi, como já afirmado, um dos expoentes máximos do “Movimento Literário da Arcádia”. Eis um exemplo deste período bocagiano: um soneto onde diz a um amigo que estava arrependido de ter seguido a carreira das armas.
Não
mais, Musa, não mais, que a lira tenho
D’um soldado infeliz presa entre as mãos;
Já não troco os clarins pelos irmãos
Do Pindo, onde cantava alegre e estranho.
Desprezo
do herói grego o nobre empenho;
Não me seduz os Troianos vãos troféus;
Mil vezes mais estimo a doce paz
Que ao campo e à flor dos vales faz engenho.
Não
mais o coração se me devora
Pelo ardor de batalhas ou de glórias:
Apenas o sossego agora implora.
Antes
quero buscar nas escapórias
Dum bosque a sombra amena e encantadora,
Que as sangrentas e incertas vitórias.
Podemos
dizer que este conturbado período da sua vida, embora marcado por uma adesão
estética e estilística paradigmáticas, antecipa e enfatiza já os “desequilíbrios
futuros”, pois o nosso poeta vive a sua curta e intensa vida em busca, em
procura, em demanda constante pelo Amor e pelo Sentido, e agarra-se àquilo (isto
é, à sua trajetória errante, disruptiva e problematizante da sua vida) que se
vai consubstanciando ou convertendo no que ele considera ser o essencial (exatamente
o que está referido nos seus belíssimos e soberbos sonetos). Aqui chegados,
podemos dizer que Bocage sente o peso dos ideais coletivos da sua época e do
paradigma vigente, mas — de forma irresistível e sedutora — algo mais forte
chama por ele e o poeta começa a preparar, com produções espantosas, disruptivas,
inovadoras e “fora da caixa” para a época, o momento de subverter o cânone instituído, tido como
“oficial” e desejável (particularmente para os “Intelectuais” e Aristocratas /
Nobreza, bem como para o Clero). Bocage nunca foi uma “Maria vai com as
outras”. Como nos reza a história/biografia conhecida da sua intensa e “surreal”
vida, o nosso poeta aderiu à Arcádia (com o pseudónimo Elmano Sadino como acima
já se referiu) e fundou posteriormente uma
outra Arcádia (a “Nova Arcádia” que um pouco mais abaixo referiremos com mais
detalhe) e, a sua sorte começou a mudar para pior tendo-se visto envolvido em
vários conflitos com os seu anteriores colegas do movimento literário de que
fazia parte. E que significa tudo isto? Como acima já foi referido, a Arcádia é
uma zona/região (uma montanha extensa) da Grécia antiga onde prevaleceu o
pastoreio, o bucolismo exacerbado e o idílico, pois praticavam uma espécie de
“religião bucólica/idílica” ou algo semelhante ao Panteísmo (a crença de
que absolutamente tudo e todos compõem um Deus abrangente, e imanente, ou
que o Universo — ou a Natureza — e Deus são idênticos) de
forma muito inocente e despreocupada. De início, e considerando também o seu
período de aprendizagem e de envolvência no mundo da poesia e dos poetas e
correntes literárias e estéticas da época (vários poetas oriundos da
Aristocracia, da Nobreza e até do Clero, como o célebre “e manhoso” monge José Agostinho
de Macedo — o eterno arqui-inimigo do nosso poeta, homem truculento, trapaceiro,
imitador/plagiador de Bocage e bastante vaidoso — com quem mantinha uma relação
de “amizade” e de ódio), o nosso poeta a tudo isto teve que aderir — e aturar —
por algum tempo. (O Monge Agostinho, que muito conviveu com
Bocage, pertencia à Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho, também conhecida
como Agostinianos. Trata-se de uma ordem religiosa mendicante inspirada na
vida e ensinamentos de Santo Agostinho. Este monge estava mesmo muito afastado
e aquém do seu Patrono e extraordinário “filósofo/pensador da Igreja”…). Voltando
ao conceito da Arcádia, que “inspirou” para o bem e para o mal (e galvanizou) toda
esta gente, podemos dizer que, segundo a mitologia conhecida, os pastores
levavam uma vida inocente, idílica e feliz, em “contacto umbilical” com a Natureza
mais pura, amiga, mãe, conselheira e confidente. Assim, a ideia da Natureza
(ora como espaço real, ora como espaço utópico, mas possível — como se fosse
por excelência a “casa dos deuses” —, inspirou, de início, Bocage (Elmano
Sadino) a uma vida simples, serena e algo “bucólica” — que pouco tempo ele
aguentou — tendo como grandes referências, os ideais supremos da tranquilidade,
da paz, da harmonia… A fuga da cidade (que é hoje em dia — como sabemos — o
grande ideal e conquista de muita gente, tal como o é para nós), a procura do
lugar ameno por excelência, o Carpe Diem bucólico…, no fundo, a busca do
ideal de vida simples junto à Natureza a fim de se ser bafejado por esta na
companhia das musas que sempre acompanharam o nosso poeta, tais como — entre
outras — a doce Marília/Ritália (que, e apenas por curiosidade que partilhamos,
segundo se apurou em alguns dos seus biógrafos/historiadores, viveu algumas
temporadas — em visita por convite ou não — próximo desta sua principal musa numa
zona ainda hoje designada “Quinta do
Valle da Louza”, muito perto da vila de
Sardoal, conhecida hoje em dia — e justamente
— como Vila Jardim, a cerca de hora e meia de carro de Lisboa nos dias
de hoje — onde somos nós agora que passamos lá bem perto, “temporadas bucólicas”,
“algumas vezes serenas” e idílicas — com as nossas musas, com os nossos estimados
cães Pompeu e Napoleão, com os Javalis que nos visitam quase todas as noites
sem pedirem licença, com alguns Esquilos e também com os Gnomos, Duendes e Fadas
que por lá habitam —, qualquer coisa do género “retiro espiritual” e… Esta zona
do nosso querido e amado Portugal (que recomendamos e sugerimos para passeios e
estadias, continua ainda hoje, e esperamos e desejamos sinceramente que não a
estraguem, bela, idílica, bucólica… — talvez a lembrar a já citada e famosa região
da Arcádia Grega —) seduziu o nosso
poeta que procurava, e se refugiava, como muitos outros, à época, num lugar
idílico e paradisíaco onde pudesse “conviver” com a sua bela e doce Marília também
por vezes designada de Ritália em alguns dos seus sonetos — de seu nome de
batismo, Maria Margarida Rita Constâncio Alves — (a filha do Cirurgião do Reino e médico da Corte
Portuguesa, Manoel Constâncio, nascido na aldeia de Sentieiras, Sardoal, concelho de Abrantes, tendo
o Hospital desta pequena e pacata cidade — em sua homenagem — ficado com o seu
nome) e com as muitas musas que sempre quis
possuir (e de alguma forma o conseguiu, pois “lábia” não lhe faltou nunca a
este grande sedutor…). Como se pode pesquisar em alguns dos biógrafos de
Bocage, este era, de quando em vez, convidado (e quando não o era, arranjava
sempre uma forma airosa de se fazer convidado) para ir à propriedade do médico e
ilustre Constâncio pelos seus três filhos que eram amigos do poeta (o que lhe servia também de refúgio para
fugir às perseguições do famoso, manhoso e terrível Intendente Pina Manique da
Polícia Real e representante do Estado) e acabou por se inflamar de amores por esta Marília ou Ritália, a única
filha do médico — ela com 14 anos e ele já com 32 — o que, obviamente, muito irritou
o seu pai Constâncio. Esta arrebatada paixão de Bocage pela sua musa doce e
inspiradora (e que se tornou a principal) — em constante confronto com o seu pai
— levou este último a denunciá-lo ao Intendente Pina Manique (de quem era
amigo), e, por ordem deste, passou uma boa temporada na prisão do Limoeiro
(esteve lá por duas vezes ao que parece). Estamos em crer que este episódio (bem
como outros da delirante, intensa e errante vida de Bocage) daria uma boa novela
com produção portuguesa (pensem nisso RTP e/ou outros), qualquer coisa como “Marília
e Bocage, amores proibidos em Sentieiras - Sardoal”. Apesar de tudo, sendo
inquieto e insatisfeito, e sempre em busca de mais, de algo ousado e diferente,
o nosso poeta vai novamente em frente (muda um pouco de vida, apura e requinta ainda
mais o seu estilo e vai em busca de mais Amor, Liberdade e Sentido).
E eis que surge a “Nova Arcádia” com Bocage a ser compreendido por nós como o poeta da rutura, da diferença, da rebeldia, da transgressão, da insubmissão. Aqui recordamos um extraordinário soneto característico desta nova etapa/período do seu curioso, atribulado e singular percurso poético e mundano.
Que
falta nesta cidade?… Verdade.
Que
mais por sua desonra?… Honra.
Falta mais que se lhe ponha?… Vergonha.
O mais que possa faltar?… Verdade.
Que
mais se lhe pode dar?… Justiça.
Quem lhe pode dar já mais?… Ninguém.
Que merece o mundo todo?… Desprezo.
Quem o
merece também?… Todo o mundo.
Quem
lhe acode?… Ninguém.
Quem lhe serve?… Falsidade.
Reina nela a iniquidade.
De que está cheia?… De tudo.
E quem
a faz assim?… Todos.
Então não há mais que ver?… Não.
Bocage preza — acima de qualquer outra coisa — a Liberdade (todas as liberdades) e não aceita qualquer tipo de espartilho moral, cultural, social, religioso ou político. Foi membro desta agremiação (Nova Arcádia), mas a sua adesão e estadia foi bastante conflituosa. Os ideais de pureza e de “depuração poética” eram, para ele, máscara de mediocridade, qualquer coisa de postiço, de pretensioso, de inautêntico... O nosso poeta satirizou — muitas vezes de forma violenta — os seus pares, particularmente Filinto Elísio (“poeta” e tradutor português do Neoclassicismo. O seu verdadeiro nome é Francisco Manuel do Nascimento, e foi também sacerdote. - Wikipédia) e outros "poetastros" (como lhes chamou), e, a certa altura, mandou a “doutrina arcádica” àquela parte, tornando-se um poeta ainda mais livre, genuíno e autêntico; um poeta que assumidamente perdeu alguns filtros, mas que ganhou uma nova elegância estilística e temática, qualquer coisa de muito diferenciado e de dissonante para a época, pois Bocage foi/(é), por excelência, aquando da sua rutura definitiva com as Arcádias, o poeta “fora da caixa”, o verdadeiro poeta do “pensamento crítico e divergente”, destemido, revolucionário, corajoso e ousado, sabendo e assumindo que podia (como de alguma forma aconteceu) pagar os seus muitos excessos e devaneios líricos, religiosos, sociais e políticos pondo em causa a sua saúde e a sua “sanidade mental”. No soneto "Epístola a Marília", já se ouve a dissonância: «Mas, se a dúvida em ti causa tormento, / Dá-te à certeza, ó flor do meu desejo, / Que o amor que te dou não tem fingimento. / E se nisto duvidas... é despeito! / Vai-te então com Filinto ou com o Teixeira, / Que são fiéis de boca... e falsos no peito!.». Podemos dizer que Bocage inicia uma longa guerra e às vezes ganha algumas batalhas, pois muitos dos seus poemas são como que balas que atingem sempre o alvo. O tom é de confronto, acusatório, ferido, combativo…; e Bocage vai vivendo esta intensidade anormal e conflituosa, e foi sobretudo isso — como acima já se aflorou — a lenha que alimentou a fogueira da sua genialidade poética até ao “fim” da sua peculiar vida.
Depois da sua viagem forçada pelo Brasil, Moçambique e Goa (não tendo gostado desta última, e acabando por muito mal dizer), o governador de Goa foi obrigado a mandá-lo para Damão. Depois da aventura de Damão, conseguiu, em parceria com um amigo, arranjar um barco (tendo ambos desertado da Marinha que a bem da verdade nunca o interessou) a fim de rumarem até Macau. O governador de Macau (um tal Lázaro da Silva Ferreira) recebeu muito bem Bocage porque já conhecia a sua fama de poeta. Consta que Bocage gostou de estar em Macau e, nos seus sonetos, e também pelos vários botequins que diligentemente frequentava, o nosso poeta só diz bem desta importante colónia portuguesa na China. Contudo, e aqui chegados por esta espécie de périplo/viagem pela peculiar vida de Bocage, o nosso poeta está praticamente na miséria e até fome chega a passar. Após algumas peripécias consegue regressar a Lisboa no ano de 1790, um ano depois da famosa, impactante e paradigmática Revolução Francesa, que mudou a Europa e parte substancial do mundo, e que também mudou — ideologicamente e não só — o nosso poeta que se foi tornando cada vez mais ousado e “liberal”. E Bocage, sendo um “Livre-Pensador”, progressista, heterodoxo, bom rebelde e insubmisso, arauto de um novo paradigma Literário, Cultural e Político, bem à sua maneira, deixou também uma espécie de “legado liberal” que — arriscamos dizer — muito contribuiu para a posterior e designada “Revolução Liberal Portuguesa de 1820”. A influência da “Revolução Francesa”, que acontece em 1789, muito sensibilizou o nosso poeta (e os intelectuais mais promissores e talentosos da época) quando este já se encontrava em Lisboa em 1790 (com 24 anos de idade). Bocage é altamente influenciado pelos ideais e princípios/orientações desta significativa e impactante revolução, e, entusiasmado com ela, qual musa inspiradora (por quem muito se apaixona, mas que desta vez não é mulher de carne e osso), compõe alguns sonetos a eles dedicados (Ideais/Princípios), pois é o maior, o mais destemido e corajoso defensor da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade (o lema por excelência desta grandiosa e impactante revolução que muito nos influenciou até aos dias de hoje). Podemos dizer que Bocage se deliciou com os ventos de Liberdade que vieram de Paris e abraçou-os com tamanho entusiasmo que deu demasiado nas vistas, tendo perturbado e irritado o terrível e “manhoso” Intendente Pina Manique da Polícia Real. A partir daqui, o nosso poeta teve que redobrar as cautelas, mas acabou por ser “dobrado” pelo poderoso e esperto Pina Manique com uma espécie de “lavagem cerebral” que durante algum tempo fez o nosso poeta estar como que anestesiado, calado e sereno como se Monárquico fosse — obviamente para evitar contendas que, apesar de tudo, acabou por não evitar… — e o resto é História que daria um bom filme, com muito interesse e que podem pesquisar por aí, pois vale bem a pena conhecer a hilariante vida deste diferenciado e peculiar poeta. Podem prendê-lo e sacrificá-lo quase até à morte física, mas é certo que Bocage respira outros ares, e, sub-repticiamente, adere ao “Liberalismo” e a outras formas (enquadramentos políticos, sociais e éticos) mais dignas e humanistas que infelizmente não conseguiu experienciar em vida, pois acaba por morrer praticamente na miséria sendo enterrado em vala comum quando decorria o ano de 1805. Atente-se neste famoso soneto que muito nos diz sobre o posicionamento filosófico, ideológico, político e social do nosso estimado, admirado e genial poeta:
Liberdade,
onde estás? Quem te demora?
Quem faz que o teu influxo em nós não caia?
Porque (triste de mim!), porque não raia
Já na esfera de Lísia (Lisboa) a tua aurora?
Da santa redenção é vinda a hora
A esta parte do mundo, que desmaia.
Oh!, venha... Oh!, venha, e trémulo descaia
Despotismo feroz, que nos devora!
Eia! Acode ao mortal que, frio e mudo,
Oculta o pátrio amor, torce a vontade,
E em fingir, por temor, empenha estudo.
Movam nossos grilhões tua piedade;
Nosso númen tu és, e glória, e tudo,
Mãe do génio e prazer, ó Liberdade!
Sim, podemos afirmar que Bocage, pela forma como viveu, amou e pensou, foi a de um Romântico, tendo sido o principal precursor do Romantismo em Portugal, pois podemos caracterizá-lo, não apenas, mas também, pela ênfase na emoção e individualismo, bem como na glorificação do passado e da Natureza. Bocage foi muito particularmente o poeta da introspeção e da interioridade, que tratava a Solidão e o Desencanto por tu; foi o poeta que teve a coragem (talvez até mais o desespero como forma de luta) de levar muito do obscuro mundo que o rodeava para dentro de si. Foi também o poeta trágico, experienciando/vivenciando e fazendo parte de várias tragédias (transformando-se ele próprio em figura trágica por excelência). A juventude, que praticamente não lhe aconteceu, a miséria, a falta de recursos, as constantes perseguições, a experiência de ter estado na prisão por várias vezes e por vários motivos (sendo os principais a acusação de divulgar ideias subversivas e de conspirar contra o Estado e contra a Igreja), a doença, a boémia, a errância…; podemos dizer que praticamente tudo se converteu ou se transformou em matéria para os seus belíssimos sonetos, e, assim sendo, e reiterando, temos também uma produção poética que canta de forma “apaixonada e apaixonante”, o Amor, (histórias de amores, de desamores e busca constante do amor perfeito…) pois é, sobretudo, uma história de vida vivida/experienciada e pensada intensamente — o nosso poeta vivia como se não houvesse amanhã —, consubstanciando-se também numa produção poética fortemente autobiográfica, pois muitos dos seu sonetos são nada mais nada menos do que a síntese da sua história de vida real. Dizer também que a sua produção poética é autêntica e verdadeira — embora muito idealizada — (e a propósito do que é dito, já no século XX escrevia o também genial pensador e poeta Nietzsche o seguinte — que em nosso entender bem se pode aplicar a Bocage —: “escreve com o teu sangue e dirás a verdade”). É nesta fase precursora do Romantismo (pois Bocage é considerado pelos investigadores e académicos mais reputados e credíveis como Pré-Romântico) que a Noite, a Escuridão, a Dor, a Morte, e as Emoções negativas, se lhes apresentam não apenas como um contexto normal ou cenário de vida, mas como estados de Alma que, à falta de melhor metáfora, podemos dizer que funcionam como “tijolos” com os quais o poeta construiu uma nova, revolucionária e diferenciada realidade/mundo/vida.
Lemos
— e recomendamos também que o façam — (de preferência em voz alta,
como devem ser lidos todos os sonetos de Bocage) o famoso soneto
“Insónia” e conseguimos ouvir os ecos de Byron (George Gordon Byron,
6.º Barão Byron, conhecido como Lorde Byron, — que visitou Portugal em 1808 —
aos 21 anos — e que adorou Sintra, a “capital dos românticos”, pois ele mesmo foi
um famoso poeta britânico e uma das figuras mais influentes do Romantismo - Wikipédia) e de
Musset (Alfred
Musset, poeta, novelista e dramaturgo francês do século XIX, um dos expoentes máximos
e mais significativos do Romantismo), muito antes do advento e da
afirmação desta nova corrente artística e também ideológica de certa forma (a
angústia existencial, a solidão, a inquietação e a contemplação da Morte —
a busca por consolo, também por propósito, através da reflexão sobre a Morte
— sendo principalmente estas: Solidão, Inquietação e Morte, as suas principais
companheiras).
Que
remédio? Morrei... triste consolo!
Que fazer? Padecei... duro destino!
A razão me convence; eu me inclino
Ao peso, que não posso erguer só, tolo.
Vã
esperança me arroja a incerto polo;
A fortuna me impele a outro mais fino;
A razão fria diz-me: "É vão o ensino
Do mundo!" E a consciência grita: "É dolo!"
No
caos da dúvida, alma combatida,
Sem norte, sem arrimo, sem certeza,
Contra a fé, contra a luz, contra a verdade,
Olha o
céu... nada vê! Só vê, perdida,
No abismo universal da Natureza,
A sombra do Sepulcro, e a Eternidade.
Eis
Bocage neste soneto “Romântico” a não querer aceitar a Morte, e, de alguma
forma, em nosso entender, o também “Místico” (credo… que ousadia e blasfémia
estaremos nós a pronunciar para alguns!), a revelar-nos e a partilhar connosco
a esperança (estamos em crer que para ele, pura certeza) que deposita na
Eternidade. Eis pois o já Romântico, o também crente e o “místico” à sua
maneira. Bem sabemos que afirmar por aqui que Bocage é um “poeta místico” pode
ser algo de surpreendente e até de estranho para alguns “exegetas” e
investigadores, contudo, a nosso ver — e
não estamos sozinhos nesta leitura/interpretação — há sonetos de Bocage que são
de outra ordem, estão para lá de… — como que ditados/inspirados pela divindade…
uma espécie de fenómeno semelhante à Psicografia (a capacidade atribuída
a certos Médiuns de escrever mensagens ditadas por Espíritos), um
pouco à maneira de Allan Kardek (sistematizador e divulgador
da doutrina Espírita)… —, pois procuram alcançar outro sublime propósito/Sentido,
algo de tão inexplicável e de transcendente que outros conceitos não há para
dizer o que é da ordem do indizível.
Como já se aludiu, e tendo em conta o seu percurso de vida
mundano, subversivo, transgressor e errante, e muito particularmente, o seu
percurso literário/poético (que são obviamente inseparáveis/indissociáveis e
que se influenciam mutuamente, mantendo quase sempre uma cumplicidade
desconcertante), a dado momento da sua
vida, Bocage como que passa da água para o vinho… e seus diferenciados sonetos
são o “Fado de Portugal” (como sabemos, a semântica do Fado é o Destino, — Moira
— a
Melancolia, a Saudade, a Nostalgia, a Dor, a Tristeza, a Morte…, e essa
reflexão, simultaneamente mística e metafísica, bem como aqui e ali ontológica
— talvez inspirada em Parménides —, está muito presente em todas as fases do
seu percurso literário/poético e não apenas como precursor do dito Romantismo).
Nesta fase, a sua poesia torna-se mais individualista, obscura, impregnada de Solidão,
de muita reflexão poética-existencial (e até filosófica, mística e metafísica) sobre
o propósito e o Sentido da Vida, questionando-se e questionando os deuses (uma
vez que até certo ponto o nosso poeta é Panteísta). Nesta fase, e de forma
muito intensa e problematizante (pois também conceptualiza e argumenta com
muita frequência), o nosso poeta interroga-se amiúde sobre o papel de Deus (o
Deus cristão? Todos os deuses?), e por aí vai. Bocage começa a desenvolver uma
espécie de obsessão “filosófica” com a Morte (pois foi passando da Natureza, da
Luz e da Claridade para a Noite, para os Fantasmas, Mochos, e por aí…). Passa da Luz para a Escuridão, da Ordem para
o Caos… (“Quero fartar meu coração de horrores” é dito/anunciado de forma clara num dos seus famosos sonetos). Estamos
perante o assumido exagero sentimentalista que antecipa e indica o que irá ser a
essência do Romantismo (e também, arriscamos nós dizer por agora, a essência
dos Góticos, entendendo nós o conceito não apenas como uma subcultura ancestral
e muito curiosa — que ainda tem muito por explorar e compreender — com cada vez
mais adeptos nos nossos dias, que valorizam temas sombrios, mas também como uma
“filosofia de vida” tão legítima como outra qualquer).
Dizer ainda, alguma
coisa sobre o também poeta satírico, burlesco, anedótico, sensual, erótico (e,
de quando em vez, até pornográfico). Há qualquer coisa de “psicanalítico” em
Bocage, pois esteve em permanente conflito consigo mesmo e com os outros, e
queremos destacar, em particular, o conflito “almífico”. Utilizando — e
sem pedir licença a Freud — a terminologia psicanalítica e a sua típica
semântica do psiquismo humano/Mente — que dá agora muito jeito — Bocage viveu na “corda bamba dos
contrários”; isto é, passou grandes temporadas a viajar pelo seu Inconsciente
(muito bem caracterizado por Freud e que facilmente podem pesquisar) e passou
outras temporadas no Consciente querendo viver nesta dimensão do psiquismo
humano/Mente com aquilo (material psicanalítico) que experienciou no Inconsciente.
Assim, podemos dizer que houve simultaneamente um Bocage do abismo e do
escândalo, e também um Bocage da Dádiva e do Amor, que amava como mais ninguém,
que divinizava e cortejava todas as mulheres (a deusa Mulher) — as solteiras, as
casadas, as filhas destas, as viúvas, as novas, as velhas, e… —, pois, e como
bem deixa entender na sua obra, a Mulher é a essência do mundo e este é feminino.
Nenhum outro poeta português ousou dizer tanto com tão pouco pudor (leia-se, sem
reservas éticas ou moralistas, sendo tão autêntico e assumindo a vida como ela
de facto lhe acontecia, o famoso “Soneto de todas as putas”, bem como
outros do género que, apesar de versar sobre erotismo e “pornografia”, nos são
apresentados — sem peias nem rodriguinhos — como uma importante dimensão das
nossas vidas que temos que aceitar/assumir, mas, à maneira de Bocage,
desejavelmente de forma elegante). Na sua poesia satírica, burlesca, sensual e
erótica, o riso mistura-se com a crítica social, com a obscenidade — que, como
sabemos, veio a ser uma poderosa ferramenta psicanalítica — e também
com a lucidez e o rigor (pois estamos no século da “deusa Razão”). Entre outros
argumentos, em prol da interpretação/hermenêutica mais coerente e apropriada do
fazer-poético de Bocage, um deles — e a nosso ver, muito importante — é, por
excelência, a sua coerência/rigor temática, estilística e formal.
Bocage é também o poeta do corpo e do desejo, não deixando de refletir —com muita frequência e de forma magistral — a relação do corpo com o espírito e com a Ética/Moral (Axiologia). Que se saiba, Bocage não foi nem legislador nem praticante de nenhuma ortodoxia em especial, seja ela Ética/Moral, Política, Religiosa ou outra; porém, sobre tudo isto opinou (e delirou, divertindo-se bastante aqui e ali e tantas vezes sofrendo também) para compreender a fim influenciar a conjuntura (o sistema), a fim de contribuir para a mudança, a fim de alterar para melhor e subir, subir até ter a certeza da Eternidade, pois em seu entender, e também no nosso, é esse por excelência, o grande desígnio da humanidade: estar sempre a subir a fim da Eternidade. Neste aspeto em particular, parece ter sido o homem em Portugal — no seu tempo — que mais teve a coragem e a ousadia de conjeturar a Eternidade. E o que fica, o que mais nos sensibiliza, nos confronta, nos inquieta, nos interpela, mas também nos diverte, é o seu maravilhoso legado (infelizmente por muitos ainda desconhecido) poético do grande libertino, do boémio, do mundano, do sempre transgressor e errante, pois Bocage continua a ser único e irrepetível (tal como qualquer obra de Arte). Não há ninguém na portugalidade (quero dizer, no “Grandioso Império da Língua Portuguesa”) que não conheça uma faceta — breve e singela que seja — de Bocage que não cause riso, divertimento, confronto ético e moral, social e filosófico… O nosso poeta viveu fisicamente 40 anos, mas a intensidade, a tragédia, bem como as muitas peripécias da sua peculiar e “surreal” vida, permitem-nos concluir que nunca morreu (mesmo para os mais céticos da coisa em questão), pois a sua “Alma grande” paira por aí (continuando bem vivo em todos nós). E se outro conceito e semântica de Eternidade não fizer sentido para muitos de vós, afirmamos nós — sem rodeios e sem nenhum receio de crítica ou de contraditório — que o nosso poeta é eterno, pois o povo jamais o esquecerá.
No soneto satírico “A um poeta moderno”, eis Bocage a ridicularizar
os imitadores vazios: «Tu que rimando vais por mau caminho, / Que tudo o que
escreves cheira a esterco, / Que tens o pensamento vão e perco...». E no
soneto erótico “Às moças que vendem beijos”, revela a crueldade, anormalidade e perversidade da luxúria: «Oh
vós que dais do amor o doce alento / Por um vintém, num canto tão escuro...». Estes
versos chocaram, escandalizaram, geraram longas conversas e opiniões negativas
e foram motivo de grande censura, mas continuam vivos, porque a “verdade
poética”, a autenticidade, apanágio e característica essencial do nosso poeta (que
pode mesmo ser muita coisa e entendido/compreendido de diferentes formas para
muitos), é mais duradoura do que a ética/moral de cada época da história da
humanidade. Assim, os poemas satíricos, burlescos e eróticos, por razões várias
e diversificadas (e como sabemos não são de todo as melhores e mais eloquentes produções
do poeta), acabam por ser os mais conhecidos em detrimento de outros que urgem
ser conhecidos, fruídos e divulgados e que, honra lhes seja feita, vários dos
nossos autores desta “obra de culto” por aqui divulgam e comentam. Eis o
inevitável poeta português e do mundo que em busca de uma certa “Felicidade ou
Bem Estar”, que podemos também associar a uma certa e peculiar forma de
hedonismo, se entrega — deliberada-Mente — aos prazeres carnais, à boémia,
numa permanente busca de Sentido, de Satisfação,
de... Também os Rolling Stones foram — à sua maneira — grandes hedonistas
e como que bocagianos, bem como o nosso amigo e poeta, coautor desta obra, Von
Trina – "(I Can't Get No) Satisfaction" – famoso tema desta
mítica banda de Rock Inglesa composto em 1965, cuja letra bem podia ter sido
escrita pelo nosso poeta Bocage — apesar do distanciamento cultural e social de
cerca de dois séculos — ou mesmo pelo poeta Von Trina que acreditamos ser uma
das suas reencarnações tal como o será também o poeta e amigo Carlos Santos
Bueno (um outro poeta que integra esta vossa/nossa “obra de culto”).
Recomendamos que leiam também o «Soneto de Todas as Putas» bem como o «Soneto da Cagada» (que não colocamos
aqui por causa dos puritanos literários, dos demasiado ortodoxos, dos muito éticos,
dos moralistas e afins). Contudo, estes sonetos são como que hinos às coisas
“simples” e menos evocadas da vida (sem merecimento para reflexão poética ou
filosófica e que Bocage veio contrariar e subverter…) que, sendo simples,
acabam por ser, muitas vezes, as mais importantes e necessárias, também na
ótica de Bocage. Só mesmo o nosso poeta para se ter dado ao trabalho (engenho e
talento) de dedicar um soneto às putas que tanta “felicidade” (e também tragédia)
lhe proporcionaram e outro às cagadas… (algo que pessoalmente — com a idade —
alguma “felicidade e bem estar” nos proporcionam) como bem dizia o nosso
querido amigo, também poeta e filósofo, grande admirador de Bocage, Júlio
Roberto, que na Eternidade também está e estamos em crer que com Bocage muito
tem convivido. Recomendamos a leitura e fruição destes sonetos pelas seguintes
razões: além do gozo, do divertimento (pois Bocage foi também uma espécie de
humorista, e hoje seria muito provavelmente um bom praticante de Stand Up),
da crítica implícita, da ironia sub-reptícia, da aceitação e da reflexão de
todas as dimensões da vida humana que ousadamente e corajosamente Bocage
partilha, estes sonetos em particular, são significativos na sua essência e
propósito; sensibilizam-nos e “obrigam-nos” a olhar (a reparar) em realidades
por alguns consideradas — erradamente — apenas secundárias ou de menor
importância, mas que fazem parte das nossas vidas; além disso, divertem-nos (o que não deixa de ser muito
importante e necessário); dispõem e…
Esta obra de tributo (“escrever
BOCAGE”) é bem mais do que uma
homenagem, é também uma celebração, a justa apologia, pois consubstancia-se num
reencontro, e cada vez que “nos encontramos” ou revisitamos Bocage, somos confrontados e surpreendidos
com o seu talento, com a sua genialidade e com a certeza de que cada soneto é
um “oceano de polissemia e de interpretações várias”, nem sempre consensuais (o que é — por isso
mesmo — muito interessante e também divertido). Em cada leitura/fruição,
encontramos sempre mais qualquer coisa que nos fascina, entusiasma, sensibiliza,
e... Bocage (e Elmano Sadino) foram vários e diversificados e esta obra vem
também demonstrar/provar que há facetas/dimensões do poeta — e da sua obra —
por descobrir, compreender e outras a necessitarem de ser reinterpretadas. Bocage
não cabe numa simples estátua (ou em várias), e muito menos num manual ou num
tratado, por muita que seja a legitimidade, a credibilidade, o academismo e a sabedoria
dos seus autores. Bocage foi Arcádia e anti Arcádia (com tudo o que isso
significa), foi Luz e Escuridão, Dia e Noite, Carne e Espírito, Mortal e Eterno.
O que aqui se reúne e conjuga, nesta singela e despretensiosa “obra de culto”
em sua homenagem, organizada e materializada de forma ousada, livre e corajosa,
são trinta e dois autores
de “primeiríssima água” que, necessariamente inspirados no vate, fazem uso da
Poesia, também do Soneto, do Ensaio, da Crónica, da Epistolografia e de outros géneros
e subgéneros literários, para nos
dizerem e enfatizarem que Bocage foi, (é), e continuará a ser, um expoente
máximo da Literatura portuguesa (o maior poeta de Língua Portuguesa a par do também
vate Camões que considerou seu mestre). Bocage não foi só e apenas o genial
poeta, foi também um ser humano em permanente estado de “excesso” e de ousadia;
e também por isso, nos rendemos hoje ao “encanto” e à trágico-comédia do seu
percurso de vida que proporcionou o seu legado poético que continua hoje a
sensibilizar-nos, a impactar-nos e a confrontar-nos.
Em 1805, com apenas quarenta anos de idade, e já com a intuição do “fim” desta reencarnação, Bocage revela-se — de forma ainda mais intensa e assumida — o “místico” e também o crente, com a produção deste último soneto que muito nos interpela, confronta e faz pensar. Não rasguem os seus versos nunca como ele recomenda, mas sim, sigam o seu último conselho e creiam na Eternidade.
Já
Bocage não sou!… À cova escura
Meu estro vai parar desfeito em vento…
Eu aos céus ultrajei! O meu tormento
Leve me torne sempre a terra dura.
Conheço
agora já quão vã figura
Em prosa e verso fez meu louco intento.
Musa!… Tivera algum merecimento,
Se um raio da razão seguisse, pura!
Eu me
arrependo; a língua quase fria
Brade em alto pregão à mocidade,
Que atrás do som fantástico corria:
Outro
Aretino fui… A santidade
Manchei!… Oh! Se me creste, gente ímpia,
Rasga meus versos, crê na eternidade!
Não
morrendo nunca, jamais, pois é eterno, deixa esta reencarnação em 1805 aquele
que — para alguns — foi considerado o maior poeta de Língua Portuguesa depois de Camões, e que —
para outros — é considerado o maior poeta de Língua Portuguesa a par de Camões.
Decidam-se…, pois nós já passamos por essa “deliberação” e depois foi tomada
uma óbvia decisão. Lá continua Bocage no Olimpo — pela Eternidade fora — a
inquietar e perturbar os deuses com os seus magníficos sonetos. Viva a Língua Portuguesa. Viva Bocage! Venham
comigo até ao Nicola («O Café Nicola foi fundado em 1787
por um italiano chamado Nicolau Breteiro, conhecido como Nicola.
Posteriormente o negócio foi assumido pelo português José Pedro Silva, que
manteve o nome do café. O cliente mais conhecido foi mesmo o nosso poeta
Manoel Maria de Barbosa du Bocage» - Wikipédia) beber
um café e “tertuliar” a vidinha (evocar e invocar as “coisas” Físicas e
Metafísicas), pois a despesa será acrescentada à já significativa e escandalosa
conta do nosso poeta (que — ao que parece — ainda lá se encontra para pagamento,
pois Bocage sempre foi um “caloteiro” de primeira…). Pelo que foi possível
apurar, não foi por esta dívida que Bocage “bateu com as costas” no Limoeiro («No
tempo de Bocage, a prisão do Limoeiro era uma cadeia pública em
Lisboa. Bocage foi preso lá em 1797 por ordem do Intendente da Polícia,
Pina Manique, devido aos seus "costumes
desordenados". Permaneceu detido até 14 de novembro do mesmo ano,
quando foi transferido para o calabouço da Inquisição» -
Wikipédia), onde foi, muito provavelmente, incomodado e atormentado
por um guarda iletrado e que de sonetos nada sabia. «Se eu fosse ignorante,
também era feliz» e não estaria por aqui, disse-lhe, provavel-Mente,
Bocage.
Contaremos
com todos vós (ou com a maioria) nos próximos projetos literários que
tencionamos desenvolver e publicar, e, para tal desiderato, necessitamos
obviamente do seu precioso apoio, da sua necessária participação, entusiasmo e
galvanização, e que nos continue a contagiar com a paixão que tem evidenciado
pela nobre causa da Literatura. Mais uma vez, obrigado a todos pela confiança e
pela dedicação demonstradas a esta causa que nos parece necessária e cada vez
mais nobre (que é até para alguns considerada como uma espécie de “serviço
público” em apoio da Língua Portuguesa). Para todos vós, um grande e renovado
abraço do tamanho do Uni-Verso. E, à semelhança do talentoso
Bocage, que nos continua a inspirar, motivar e galvanizar, inquietem-se,
revolucionem-se e aventurem-se, mas procurem ser felizes — por muitos, bons e
longos anos — até ao suposto “fim” que mais não é do que um novo “princípio”
(acreditem se quiserem neste também místico que convosco estas coisas partilha).
Obrigado
Bocage por teres sido quem foste (quem és)! À semelhança do grandioso Sócrates
— e para que não exista qualquer tipo de confusão, estamos obviamente a invocar
e a evocar o filósofo grego da antiguidade clássica que ele tanto amou —,
também o nosso poeta se «comportava como uma espécie de moscardo que
espicaçava as consciências adormecidas no sono fácil das ideias feitas» e
tanto que isso nos inspira até hoje! Obrigado autores por estarem connosco
neste diferenciado e ousado projeto, pois estamos certos que a excelência do
vosso exercício literário (em qualquer género aqui apresentado) irá também —
desejavelmente — espicaçar algumas das consciências adormecidas e tacanhas
deste nosso tempo tão conturbado, difícil e problemático (tal como foi também o
tempo físico — a reencarnação — de Manuel Maria Barbosa du Bocage). Assim, e à
semelhança de Bocage, e por ele inspirados, que possamos todos nós ter
mais coragem e que ousemos uma mudança (transfiguração
/ transformação); e que tal coisa nos possa proporcionar uma experiência mais
significativa nesta vida e um olhar/entendimento do Mundo/Realidade mais
sedutor e diferenciado, algo de criativo e de inovador, qualquer coisa parecida
com o processo de Metanóia.
1 comentário:
Um grande abraço a todos os autores e até ao dia do lançamento.
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